
- Como estão seus pais? – Perguntou para Luzia sua neta.
- Agora o pai acalmou, mas a mãe ainda anda muito nervosa, quando eu sai ela ficou resmungando, não queria que eu viesse.
- Ainda se eu fosse uma sogra ruim! – As duas riram. Luzia tomava um gole de chá e no meio parou quase se engasgando.
- Minha filha calma tem mais chá no bule – disse no tom irônico que a neta tanto gostava de ouvir.
- Não, não é isso vó Tê, quando eu estava saindo minha mãe gritou lá de dentro.
- Pede para ela contar a historia dos três amores pra você!
Dona Teresinha parou de tomar o chá e se aprumou na cadeira. Mulher elegante alta e ainda muito bonita, parecia que se preparava para uma luta, respirou fundo e disse:
- Minha filha, sua mãe me culpa pelo que aconteceu a você, para ela sou má influencia – fez um coque em seus cabelos louros, respirou fundo mais uma vez, como que tomando coragem para pular em uma piscina - Ainda bem que temos tempo!
- Luzia sua mãe diz que somos muito parecidas – a garota olhava para a avó fixamente como que hipnotizada – o que acontece quando todo mundo diz para você, por exemplo, dizer sim?
A garota acordou de um transe e respondeu automaticamente.
- Digo não!
- Pois foi o que eu fiz, disse não a primeira chance de ser feliz em minha vida.
- Sem medo de se arrepender? – perguntou a garota colocando uma almofada em suas costas e mudando de posição na cadeira.
- Ah! Eu me arrependi sim! Liguei para ele, mas pelo tom do alô percebi que as coisas tinham mudado, tudo bem que já tinha se passado quase dois anos. Chorei, mas passou.
E daí em diante minha vida mudou drasticamente, meu pai ficou doente e logo morreu, a situação ficou difícil, minha mãe nunca disse nada, mas eu via nos olhos dela aquela frase:
- Se você estivesse casada tudo isso seria diferente.
- Vó a senhora já trabalhava na lanchonete?
- Não eu trabalhava em um posto de gasolina, usava um shortinho, minha filha! Tinha um corpão esse cabelo aqui era bem mais loiro e vinha até a cintura.
- Eu lembro achei uma foto. Linda vó! Meu pai morreu de vergonha e minha mãe meteu a boca – disse a garota que parecia incomodada com a cadeira.
Teresinha fez um gesto com a cabeça como que dispersando o comentário da mãe de garota e continou.
- Nossa vó! Como a senhora conseguiu manter o emprego? – Luzia se levantou e ficou em pé atrás da cadeira, quando sua avó olhou com cara de interrogação Luzia apontou para suas costas. Teresinha voltou a sua narrativa.
Luzia colocou mais chá em sua xícara e perguntou:
- Por que o segundo amor da sua vida tem a ver com meu pai?
Filha conforme o tempo foi passando eu percebi que Edmilson não trabalhava e que eu o estava sustentando, o chamei para conversarmos, e essa foi a única vez que me lembro de ter conversado com ele. Edmilson não gostou, estava bêbado como sempre, ficou muito violento, tanto que me bateu. Luzia meu pai morreu com oitenta e cinco anos, sem nunca ter me batido uma única vez. Quebrei uma garrafa na cabeça dele e depois disto nunca mais nos vimos ou falamos, soube que ele foi preso pouco depois, mas eu já estava muito, muito ocupada nessa época.
Eu vivia tão bêbada que em menos de três dias estava com um, ou outro, ou os dois ao mesmo tempo, não importava quem. Minha filha não sei como não peguei uma doença.
Teresinha olhava para o longe como se procurasse a resposta em seu passado.
- E meu pai? – Perguntou a garotinha enquanto esticava seus cachos loiros para frente.
Sem se mudar de posição Teresinha continuou:
Eram umas dez da manhã de um domingo, eu estava voltando da balada obviamente bêbada, como sempre, e como sempre achei de vomitar em algum poste, mas desta vez foi muito forte, forte como eu nunca tinha sentido antes. Luzia para evitar detalhes desinteressantes a um café da tarde, estava quase desmaiando quando um homem apareceu e me pagou no colo, ele não disse nada, acordei no hospital com minha mãe desesperada, o médico disse que eu tive muita sorte de não perder o bebê.
- Bebê? – disse quase gritando Luzia – Eu sabia que meu pai não é filho do vô, ate porque ele é moreno e o vô bem clarinho...
- Isso mesmo minha filha, grávida de Edmilson – disse Terezinha interrompendo a menina como que para evitar alguma coisa – um homem sem futuro, este assunto sempre foi tabu, mas, agora que você também está grávida, e sem ter se casado, acho que não precisamos manter nossos tabus.
A garota fez sinal afirmativo com cabeça fez um carinho em sua barriga de sete meses e perguntou:
- Esse homem é o seu terceiro amor?
Sim, mesmo na situação que eu estava o rosto dele ficou gravado na minha mente, perguntei a minha mãe, ela disse que ele morava na nossa rua desde pequeno.
Como eu havia passado os últimos quatro anos bêbada não o tinha visto me olhar com olhares de desejo, esse termo foi o que minha mãe usou.
Eu fui encontrá-lo para agradecer a ajuda, que tragédia, ele disse de imediato:
- Teria feito isto por qualquer outro bêbado!
Luzia eu quase cai, na verdade eu cai, mesmo porque tive um enjôo fortíssimo e vomitei no tapete dele. Já não sabia mais onde colocar a minha cara, me desculpei e quando estava me levando embora ele me chamou para sair, perguntei se ele saia com bêbadas, e ele disse
- Você não via beber comigo. – Essa frase foi tão forte para mim que aceitei.
Saímos, sair de dia era tão estranho, ele me levou a uma fera de animais, fazia tempo que eu não me sentia tão viva. Conversávamos sobre tudo, menos sobre meu passado. No final do passeio já de noite ele me abraçou e estava quase me beijando quando eu parei e disse que estava grávida, ele respondeu.
- Isso não é problema pra mim, é pra você. – Estava selado o meu terceiro amor.
- Qual o nome dele vó? – disse Luzia se sentando de novo.
- Francisco – disse Terezinha automaticamente.
A garota se mexeu para dizer algo mas sua avó a interrompeu.
- Sim foi assim que eu conheci o seu avô. Digo seu avô, pois, foi ele quem criou seu pai, e como nós sabemos que pai, é aquele que cria.
- Nossa vó que historia forte!
- Minha filha – disse Terezinha molhado a boca no chá – essa historia que eu te contei não tem quase nada de romântico, e eu a conto sempre, porque ele tem fatos que vivi, são amores que eu tive e tenho, lembrando estes amores e tragédias eu continuei mais quarenta anos tive mais três filhos e cinco netos. Minha filha eu já errei muito. Mas, nunca cometi o mesmo erro duas vezes.
Luzia se ajeitou na cadeira com uma mão acariciava a barriga e com a outra os cabelos.
- Por que minha mãe não gosta desta historia?
Terezinha que se manteve a conversa inteira na mesmo posição, sentada em sua cadeira achou que era hora de variar, pegou uma torrada e se levantou.
- Bem minha filha, como hoje é dia de quebrar tabus, vou te contar como a sua mãe conheceu meu filho e a família toda...
Não podia teminar este texto sem a referencia musical de sempre.